Cícero, denunciando Catilina no Senado

Cícero, denunciando Catilina no Senado

21 maio, 2007

Traição e aleivosia


Não creio que a instauração de processo disciplinar a um professor com 20 anos de carreira por vias de um comentário jocoso sobre a licenciatura (ou sobre a falta dela, não se sabe bem) do primeiro-ministro tenha deixado espantada qualquer pessoa minimamente atenta ao modo de estar na política do Sr. Pinto de Sousa e alguns dos seus sequazes. Esta reedição quinhentista dos crimes de lesa-majestade de primeira cabeça é tão só mais um dos subtis sintomas da deriva autoritária que as coisas levam. Em níveis muito distintos, já tivemos outros sinais que só aqueles que não querem ver – os verdadeiramente cegos – poderão levar à conta de boas intenções: desde um sistema de delação de corruptos (leia-se: aqueles que o funcionário respectivo julgar corruptos ou cuja denúncia seja de molde a agradar ao patrão), passando por uma política de prevenção criminal baseada em paradigmas tão reconhecidamente ineficazes como populistas (veja-se o afloramento dos modelos name and shame na publicação do nome dos devedores ao fisco), passando pela erosão da autonomia do Ministério Público e pela centralização do comando de polícias, dos serviços de informação e dos dados pessoais do cidadão (o cartão único), até ao uso do sistema penal como prima ratio da política social, desde, claro está, que se trate da promoção de valores próprios, à margem dos consensos sociais que são – nesta matéria, mais do que em qualquer outra – exigíveis numa sociedade verdadeiramente democrática. É, pois, nestes “valores” – delação, coscuvilhice, controlo e exclusão – que assenta o programa governativo no que respeita ao seu modo de interagir com o cidadão e, sobretudo, com o cidadão dissidente (a propósito, o citado professor fora já deputado do PSD). Talvez nenhum dos referidos sintomas fosse de molde a, por si só, suscitar inquietação. Juntos, porém, já têm um sentido que dificilmente se pode ou deve desconsiderar.

6 comentários:

Anónimo disse...

Li a notícia e fiquei siderado julgando que fosse uma patranha de mau gosto. Afinal o mau gosto resume-se a usar o nome ilustre de Torquemada para ilustrar este post ! Tudo o resto é sinistramente verdade. Não tarda e esta pandilha vai cuidar de meter as suas manápulas nos blogs. Cuidem-se pois o BigBrother Pinto de Sousa e seus torcionários estão por aí.
Torquemada Suave.

Anónimo disse...

O Pinto, vestido de bispo inquisidor...mmmmm

LOL

Vergonhoso, sem dúvida. E o professor, não recorreu aos tribunais???

Anónimo disse...

isto (a propensão totalitária de socrates) é o que venho a dizer há já algum tempo aos meus conhecidos, que claro está, me chamam de exagerada e alucinada. subscrevo totalmente este post.
um abraço

FMS disse...

Marquem bem o que digo, em 2009 a corja grunhesca anestesiada vai toda votar nos gajos outra vez, ou em qualquer coisa parecida como é costume.

Solum disse...

Podes acrescentar à lista a intenção de os serviços enviarem via internet a lista dos grevistas. A Srª Dª Profª Drª Lurdes da Educação já mandou, no início do funesto mandato, ordem de serviço com esse teor para as Direcções Regionais. Como um tribunal, por sinal açoriano, declarasse o procedimento inconstitucional, a Madame Rodrigues saiu-se com um burridade histórica na SIC Notícias: que as decisões dos tribunais açorianos não valiam em Portugal! Eis quem nos governa.

Anónimo disse...

E podia acrescentar ainda aquela outra da "avaliação" da função pública em termos de o cidadão poder criticar anonimamente um ou outro funcionário da administração regional. Nessa, nem o Troquemada da ilustração tinha pensado.